Nota política: Sobre o rompimento da “Gestão Ponta de Lança” e o DCE que queremos construir na UFMG

Embora concordemos com a necessidade de maior transparência nas entidades como um todo e uma apuração consequente dos fatos apresentados, também entendemos que seria um problema gravíssimo que o DCE atrasasse a realização de um novo processo eleitoral para após a finalização da apuração.

Nota política: Sobre o rompimento da “Gestão Ponta de Lança” e o DCE que queremos construir na UFMG

Nota política da UJC e do PCBR em Minas Gerais

O Diretório Central dos Estudantes (DCE) da UFMG, entidade máxima de representação dos estudantes, foi palco de um grave escândalo no Conselho de Entidades de Base (CEB) do dia 22 de abril onde assistimos a implosão da gestão "Ponta de Lança", composta por Afronte (Resistência/PSOL), Correnteza (UP) e Juntos (MES/PSOL). A crise foi inicialmente deflagrada pela denúncia apresentada ao Conselho pelo Afronte, que acusa o Correnteza de tentativa de superfaturamento/desvio de R$2 mil na contratação de um ônibus para o  Congresso Nacional de Entidades Gerais (CONEG).

Nós, da União da Juventude Comunista (UJC) e do Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR), acompanhamos atentamente os desdobramentos dessa crise e entendemos que, embora a denúncia de tentativa de desvio de recursos exija uma apuração, que já se encontra em curso pelo conselho fiscal, a disputa não se trata de uma mera acusação de desvio financeiro, como o Afronte tenta emplacar em sua nota mas, fundamentalmente, de um choque entre dois projetos políticos radicalmente opostos para uma entidade que, após uma coletânea de tensões acumuladas, demonstraram sua inconciliabilidade.

No último período, todos os movimentos e organizações que compõem o campo de oposição de esquerda na UNE acompanharam o giro à direita empreendido pelo Afronte, associando-se cada vez mais à majoritária da UNE (PT, Levante e UJS). Como uma confirmação dessa posição, no CONEG realizado em abril, a Juventude Sem Medo, campo composto pelo Afronte e outras juventudes do PSOL, votou contra o voto secreto e a favor de processos burocráticos que esses setores conduzem visando manter sua hegemonia imobilista na UNE. Para nós, é evidente que essa prática política não se distingue da postura subordinada desses partidos em relação ao governo Lula-Alckmin, que se furtam de apresentar um posicionamento firme enquanto oposição de esquerda ao governo e construir uma alternativa de independência política para a classe trabalhadora estudantil - algo que, inclusive, nenhuma das forças que anteriormente compunham a gestão agora implodida, reivindicam. Assim, esse campo não apenas se exime de criticar essa política, mas é incapaz de combatê-la, subordinando e restringindo-se às formas de luta institucional.

Esse giro se confirma ainda mais na nota lançada pelo Afronte, onde afirmam que o Correnteza busca fugir da denúncia, e caracterizam as questões políticas nacionais como “cortina de fumaça”. Uma força que coloca para os estudantes  que a sua guinada à direita no cenário político nacional pode, de alguma forma, ser entendida como uma cortina de fumaça, só demonstra o seu completo descompromisso com uma verdadeira politização do debate estudantil, que de forma alguma pode descolar o que acontece no cenário mais próximo e direto, do cenário de disputas nacionais, sob o risco de estreitar sua visão e incorrer em erros de análise e atuação política.

Um momento recente que escancarou os limites dessa prática política foi a condução da greve nacional dos trabalhadores do ensino superior federal que se deu no ano passado. Assim como em todo o país, na UFMG os técnicos-administrativos da educação foram a vanguarda desse processo, sustentando a greve por três meses. Diante dessa firme mobilização, os docentes começaram também a se movimentar e, foi somente com a paralisação de parcela dos professores, que a gestão do DCE, na figura do Afronte, pressionado pelo corpo estudantil e pela instabilidade do calendário acadêmico, foi obrigada a colocar em pauta a possibilidade da greve estudantil. Isso aconteceu em uma assembleia esvaziada e com pouquíssima presença de estudantes independentes, tendo sua composição majoritária formada por estudantes já organizados. Naquele momento, a entidade não foi capaz de dirigir e imprimir um debate consequente sobre a greve como instrumento de mobilização. Aprovou-se por consequência, uma greve que não conseguiu disputar a consciência política dos estudantes e tampouco os rumos do movimento em busca da recomposição orçamentária.

Cabe agora, uma análise mais profunda sobre a aliança que conformou a gestão “Ponta de Lança”. Sabemos, evidentemente, que é parte do processo de luta delinear alianças táticas ao longo da disputa política que permitam avanços importantes na organização da classe. Uma posição de sectarismo, onde nunca se é possível fazer concessões, alianças ou variações de tática para ganhar posições, não apenas enfraquece, como muitas vezes impede que ganhemos frentes importantes para a organização da classe que posteriormente poderiam vir a ser utilizadas contra os nossos inimigos. Essas alianças e a política de alianças como um todo, entretanto, jamais podem comprometer a diferenciação programática dos partidos, movimentos e coletivos que as empreendem, e muito menos comprometer sua independência política, sob o risco de cair num processo de subordinação e reboquismo que impede uma luta consequente acerca dos temas que verdadeiramente importam para os estudantes trabalhadores.

Nesse ponto, entendemos ser necessário apontar que nessas últimas eleições, o movimento Correnteza, quando optou por se conformar em aliança com esse campo, furtou-se da oportunidade de realizar, desde as bases, uma disputa programática reafirmando as diferenças mais essenciais - e que já existiam - entre o campo de oposição de esquerda e o campo que hoje se alia à majoritária da UNE, talvez pela certeza pragmática da vitória eleitoral. Apesar de entendermos a conformação dessa aliança como uma tentativa de arrastar o Afronte para uma atuação mais combativa e consequente a partir da disputa interna à entidade, acreditamos que os camaradas se depararam com uma limitação expressa, levando em consideração, inclusive, o histórico de hegemonização e imobilismo desse campo na universidade.

Assim, se engana quem argumenta que esse rompimento marcado pelo CEB de 22 de abril é meramente um debate sobre a política financeira da entidade, transparência no ME, ou uma “simples disputa política entre correntes”, como caracteriza o Rebeldia. E se engana ainda mais quem acredita que esse debate pode ser resolvido com uma simples “apuração dos fatos” como se os fatos pudessem ser de alguma forma descolados da política. Essa argumentação simplista, além de empobrecer o debate político e realizar uma análise de conjuntura extremamente frágil, coloca o movimento estudantil na posição de um mero jurista, empreendendo uma busca infinita por uma suposta imparcialidade impossível de ser encontrada. 

Embora concordemos com a necessidade de maior transparência nas entidades como um todo e uma apuração consequente dos fatos apresentados, também entendemos que seria um problema gravíssimo que o DCE atrasasse a realização de um novo processo eleitoral para após a finalização da apuração. Esse entendimento se dá na medida que o cenário de ataques que enfrentamos é cada vez pior na universidade, em que a questão orçamentária, restringida pelo arcabouço fiscal e os cortes do governo federal, expressa-se na ausência de uma política efetiva de permanência e alimentação estudantil, nos preços absurdos no bandejão, na precarização da infraestrutura dos campi, etc. Para lidar com todos esses problemas, precisamos de uma gestão coesa, que consiga representar os estudantes e dar consequência a uma política combativa e radical para o movimento estudantil. Além disso, também entendemos que uma entidade do tamanho do DCE UFMG não pode se limitar somente às lutas mais locais e imediatas. Precisamos forjar uma entidade que, como uma ferramenta do Movimento Estudantil, mobilize e construa as lutas mais fundamentais da classe trabalhadora, como se apresenta hoje a luta pela escala 4x3, redução da jornada de trabalho para 30h semanais e pelo fim da escala 6x1.

Nesse sentido, apoiamos a decisão do CEB Eleitoral de 19/05 que aprovou um calendário conjunto para as eleições de DCE e tiragem de delegados para o CONUNE. E, embora consideremos o tempo proposto para a realização da campanha curto, e tenhamos apoiado um calendário mais extenso que permitiria maior qualidade à disputa programática e política que marcará essas eleições, acreditamos que ela nos dá a oportunidade de disputar um novo projeto político para a entidade. Assim, fazemos um chamado a todos os estudantes a lutar por uma Universidade Popular e por um DCE capaz de conduzir as lutas com firmeza ideológica e independência política, mantendo, de maneira intransigente, o seu compromisso com os interesses da juventude trabalhadora. Afinal, no cenário político que estamos vivendo, um Diretório Central dos Estudantes que adota uma postura imobilista e omissa, nada tem a oferecer à juventude trabalhadora da UFMG.