Nota política: Assédio e omissão pelo DCE-UFAC e a urgência de um compromisso real pelo combate à violência
A simples representação simbólica de mulheres em cargos ou mídias, quando não acompanhada de práticas políticas concretas, não responde às reais demandas de gênero.

Nota política da União da Juventude Comunista (UJC) no Acre
Nos últimos dias temos visto a posição acertada de vários Centros Acadêmicos e Atléticas se desligando de qualquer vínculo com o atual DCE-UFAC, Gestão Atuação (2023-2025), pelo caso de assédio cometido, no dia 27/05 no evento INOVACRE, pelo membro da diretoria, e da tentativa escrupulosa de seus membros de tentarem negar o ocorrido e pressionar a vítima a não denunciar.
Nas últimas notas e portarias divulgadas, apenas no dia 06 de junho o DCE tomou alguma medida às pressas porque a situação escalonou e as mentiras até então não puderam ser sustentadas. Segundo documentos públicos, foi adotada a seguinte ação:
“DCE/UFAC adotada medida cautelar de afastamento provisório até a elucidação dos fatos.”
No entanto, não há clareza sobre quanto tempo durará esse "afastamento provisório", nem sobre quem ficará responsável por “elucidar os fatos”: seria uma comissão interna da própria gestão? A ouvidoria da universidade? Ou a justiça externa?
Além disso, o DCE afirma assumir o compromisso de “construir junto à comunidade universitária um Protocolo Institucional de Enfrentamento ao Assédio, como política permanente da entidade.”
Porém, até agora nenhuma assembleia estudantil foi convocada, tampouco reuniões do CEB (Conselho de Entidades de Base), que são os espaços legítimos para esse tipo de construção coletiva. Essa ausência de diálogo só reforça o que se tem visto desde o início da gestão: um temor constante de qualquer processo democrático real com os estudantes.
Desde a campanha da atual gestão em 2023, observamos que a chapa era majoritariamente construída por homens de cursos de exatas e tinha pouca presença de mulheres na construção da chapa, além disso, um dos coordenadores da antiga gestão e integrante de destaque da chapa já tinha um processo de agressão e assédio em andamento, tal fato é conhecido por inúmeras pessoas que construíram o movimento estudantil nos últimos anos.
Além disso, a presidência da entidade é composta por uma Policial Militar que sumiu depois que ganhou a gestão, deixando a presidência sem dar explicações para a comunidade universitária, sem convocação de Assembleia Estudantil ou Conselho de Entidades de Base (CEB), para comunicar os Centros Acadêmicos da mudança ou de seu afastamento. Com os últimos acontecimentos, a presidente retorna a sua função visto que voltou a assinar os documentos da Gestão.
Aliado a isso, a chapa e agora atual gestão sempre apresentou uma politica de direita contemplado desde a ala envergonhada de “centro direita” até os conservadores declarados (bolsonaristas e ex-bolsonaristas), que colocou ao longo do último ano representações de gênero e LGBTQIA+ nas mídia do DCE, mas sem construir nenhuma política séria ou em defesa dos estudantes que sofrem opressão de gênero, sexual e racial na universidade.
A gestão também realizou apenas um CEB e sempre esteve longe das maiores demandas dos estudantes, criando um espaço de “clubismo” ou um DCE “apenas para os próximos” longe dos estudantes que não se enquadram no seu “amiguismo”.
Não podemos deixar de comentar sobre o silêncio vivido em muitas insurgências do DCE nas greves e ocupações, criando espaços de diálogo somente com a reitoria e não com estudantes, como em episódios onde mesmo após serem pressionados, a representação do DCE recusou-se em assembleia, a assinar documento de legitimidade do espaço físico do Centro Acadêmico de Licenciatura em História (CALICEH), onde várias outras entidades assinaram, como centros acadêmicos, estudantes, pessoas físicas, associações e movimentos sociais.
Além disso, no ano de 2024, ainda na greve, por pressão de vários estudantes cobrando do DCE uma postura em relação a greve, ele se posicionou em nota em apoio a greve e aos estudantes afetados - no entanto, tal posicionamento pouco teve repercussão prática, e durante a própria greve, os mesmos estavam em diálogo com a reitoria, negociando o fechamento do Restaurante Universitário (R.U), postura que contribuiu para o desamparo de todo o corpo estudantil dependente do R.U. para sobrevivência e que buscava desmobilizar, além de colocar os estudantes contra a greve.
Essa medida impactou diretamente estudantes em situação de vulnerabilidade alimentar, e acabou contribuindo para que a culpa pelo fechamento do RU recaísse sobre a greve, enfraquecendo o movimento, a mobilização dos estudantes e os colocando os contra a mobilização.
É fundamental também relembrar não só os episódios de omissão, mas os momentos em que o DCE atacou diretamente estudantes mobilizados. Em um dos casos mais marcantes, estudantes que chamavam o DCE para participar de um movimento de ocupação foram expostos publicamente em uma nota oficial, que incluía seus rostos, e que culminou na ameaça de abertura de processos administrativos contra esses mesmos estudantes pelo próprio DCE e reitoria. É vergonhoso que a maior entidade estudantil do Estado atue como braço da repressão aos próprios estudantes em luta.
Na mesma nota, o DCE alegava ter recebido “1.351 votos” e afirmava estar construindo lutas em defesa da educação. No entanto, quem estava verdadeiramente chamando o DCE para se somar à luta contra o Arcabouço Fiscal e os cortes na educação eram os próprios estudantes organizados, enquanto a gestão preferiu se alinhar à institucionalidade e à reitoria, em vez de fortalecer a mobilização popular.
Aliada a uma política constantemente alinhada à direita, a gestão se mostrou ancorada em princípios de identitarismo liberal.
É um DCE que se apresenta com pessoas trans, mas não defende a implementação de cotas para pessoas trans na universidade - e, quando instado a dialogar sobre cotas e bolsas permanência, negocia com a reitoria, onde a proposta da gestão administrativa sempre predomina, sem avançar em nenhuma demanda e fazendo da UFAC uma das poucas universidades que não tem cota para pessoas trans. Possui indígenas entre seus quadros, mas não assume uma postura ativa na defesa dos povos originários e dos territórios que ocupam. Tem mulheres, mas se omite diante de casos envolvendo homens agressores dentro do espaço universitário.
Essa contradição entre a imagem que se projeta e a política que se pratica enfraquece a luta coletiva e expõe a gestão como um projeto de representatividade simbólica sem compromisso político real. No fim, trata-se de uma representação momentânea, esteticamente diversa, mas politicamente esvaziada.
Diante dos inúmeros casos de violência que atingem as mulheres diariamente reafirmamos a necessidade de construir espaços coletivos e permanentes de discussão e enfrentamento às violências de gênero dentro da universidade.
A simples representação simbólica de mulheres em cargos ou mídias, quando não acompanhada de práticas políticas concretas, não responde às reais demandas de gênero. O enfrentamento à violência, seja ela física, moral, psicológica, sexual ou econômica, não se resolve com estéticas liberais de representatividade, mas sim com organização política e ação coletiva.
A defesa de criação de cotas trans na universidade; a garantia de acesso e permanência para população negra e povos indígenas; e a construção de espaços de escuta e de denúncia e criação de fóruns estudantis para debater e construir políticas são iniciativas nos mostram que é urgente que os espaços estudantis também assumam essa tarefa, construindo, desde já, um lugar de acolhimento, denúncia, escuta e debate permanente sobre o que significa ser mulher em uma sociedade marcada por opressões.
Hoje, na universidade, nem as ouvidorias da universidade tem representação paritária da comunidade universitária, e os casos de assédio nunca são levados a sério ou julgados.
No nosso estado, a violência de gênero é algo preocupante. Segundo o Tribunal de Justiça do Estado do Acre e o estudo do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (2023), mais de 50,9 mil mulheres sofreram violência diariamente no Brasil em 2022 - o equivalente a um estádio lotado. No Acre, foram registradas 9,3 mil ações criminais e 57 casos de feminicídio a serem julgados. Em Rio Branco, o cenário é ainda mais alarmante: 6.765 processos por violência doméstica e 19 feminicídios somente no ano de 2023. Além disso, os dados mostram que 66% das vítimas são mulheres negras, evidenciando o recorte racial da violência.
Os números de feminicídio no Acre são alarmantes: é urgente que o movimento estudantil local e nacional assuma a responsabilidade de construir uma política contínua, de enfrentamento ao machismo, que não apenas denuncie, mas que paute uma universidade popular construída pela classe trabalhadora, em um enfrentamentos estrutural a condição da mulher na sociedade, as más condições de trabalho, ao fim da 6x1 que afeta a maioria da população e em especial as mulheres..
O membro que tentou silenciar a vítima deixou a gestão voluntariamente no dia 6 de junho. No entanto, até essa data, o DCE optou por ocultar essa informação, evitando qualquer posicionamento público. Agora, tenta se eximir da responsabilidade coletiva, tratando o caso como um erro individual, quando, na verdade, se trata de uma omissão grave por parte da gestão como um todo.
Manifestamos nossa total solidariedade à vítima e nos colocamos à disposição para construir coletivamente um debate sério sobre qual deve ser o papel de um DCE diante das violências e opressões presentes no espaço universitário.
E exigimos o chamamento de um CEB acadêmico para tratar sobre o ocorrido e próximos passos
E representação discente paritária para avaliar a denúncia de assédio pela ouvidoria da Universidade.
Também que o DCE exija que a Universidade Federal do Acre suspenda a matrícula do acusado pelo crime, até que seja julgado, para que não transite no mesmo âmbito da vítima.