Nota política - A ciência e a educação não podem servir ao genocídio: universidades brasileiras precisam romper vínculos com instituições israelenses!

A luta pela libertação da Palestina não pode se restringir a discursos: é preciso cortar os laços com Israel, rompendo acordos nas mais diversas áreas que sustentam o projeto colonial.

Nota política - A ciência e a educação não podem servir ao genocídio: universidades brasileiras precisam romper vínculos com instituições israelenses!

Nota política da União da Juventude Comunista (UJC)

No mês de outubro, completam-se dois anos da nova etapa do genocídio em curso na Palestina. O processo de ocupação palestina, iniciado na década de 30 e consolidado em 1948 com a Nakba, vive hoje um processo de intensificação brutal, como jamais visto pela humanidade. Somente nos últimos dois anos, foram mais de 60 mil palestinos assassinados em massa, vítimas de um projeto de extermínio sionista, apoiado política, militar e financeiramente pelo imperialismo ocidentaAlém dos massacres diretos, a fome tem sido utilizada como arma central contra o povo palestino. A própria ONU já reconheceu a existência de fome generalizada na Cidade de Gaza, resultado do bloqueio total imposto por Israel, que impede até mesmo a entrada de ajuda humanitária. Em junho, esse cerco foi escancarado quando a Marinha israelense interceptou, em águas internacionais, uma embarcação da Flotilha da Liberdade que levava alimentos e medicamentos à população. Os tripulantes foram detidos, entre eles o brasileiro Thiago Ávila, revelando ao mundo a brutalidade de uma política que transforma a fome em instrumento de guerra.

Enquanto o projeto sionista de limpeza étnica avança sobre a Palestina, o mundo assiste, em tempo real, não apenas o genocídio em curso, mas a negação do direito à vida, à terra e à memória do povo palestino. O que se apresenta não é um conflito entre iguais, mas a continuidade de um processo colonial que, desde a Nakba, busca exterminar o povo palestino, por meio de bombardeios incessantes, cercos humanitários e a transformação de Gaza na maior prisão a céu aberto do mundo. Tudo isso, legitimado pelo discurso de “autodefesa” israelense e legitimado pela cumplicidade internacional.

O Brasil não é neutro diante do genocídio em curso contra o povo palestino. Ao contrário, o Estado brasileiro mantém relações diplomáticas, comerciais e militares que o colocam como corresponsável pela máquina de guerra sionista. Embora o governo se apresente no cenário internacional como defensor da paz, do direito internacional e da solução de “dois Estados”, na prática, o país sustenta acordos que legitimam e financiam o apartheid e a ocupação colonial.

No campo econômico e militar, essa cumplicidade se evidencia de maneira explícita. Em 2023, o fluxo comercial entre Brasil e Israel atingiu cerca de US$ 662 milhões, com destaque para a exportação de petróleo, carne bovina e soja. Paralelamente, o Brasil é um dos principais compradores de armamentos e tecnologias de vigilância israelenses na América Latina. O Exército brasileiro adquiriu blindados, armas e sistemas militares de Israel em licitação que chegará ao valor de US$ 1 bilhão. Empresas como Elbit Systems e IMI Systems abastecem tanto o Exército quanto as polícias estaduais. Os mesmos fuzis, munições, drones e sistemas de vigilância usados para massacrar palestinos em Gaza também chegam às periferias brasileiras, onde alimentam a política de extermínio da juventude negra.

O capital nacional, por sua vez, também amplia negócios e normaliza o apartheid sionista. Em fevereiro de 2025, o relatório Israeli War Bonds Press Release, da PAX for Peace, revelou que o Itaú Unibanco figura entre os bancos compradores diretos dos “Israel Bonds”, títulos emitidos por Israel para financiar bombardeios, bloqueios e destruição na Faixa de Gaza, canalizando recursos do setor bancário brasileiro para a guerra. No setor privado, empresas brasileiras como Havaianas e ApexBrasil também colaboram para normalizar o regime sionista: campanhas publicitárias em Israel e rodadas de negócios conectam marcas nacionais, agronegócio e setor financeiro ao consumo israelense. O governo federal ainda manteve suas exportações de petróleo, que aumentaram 51% para Israel desde outubro de 2023, abastecendo diretamente tanques de guerra sionistas. A Petrobras, da qual o Estado brasileiro é sócio majoritário, é citada em relatório da ONU como contribuindo diretamente para a campanha militar israelense, junto a conglomerados como BP e Chevron, que forneceram parte significativa do petróleo consumido por Israel entre outubro de 2023 e julho de 2024.

No plano diplomático, o Brasil mantém uma longa história de envolvimento com Israel. Em 1947, sob a presidência do brasileiro Oswaldo Aranha na Assembleia Geral da ONU, foi aprovada a Resolução 181, que abriu caminho para a criação do Estado de Israel. Desde então, apesar de gestos limitados de solidariedade ao povo palestino, os sucessivos governos brasileiros jamais romperam com os vínculos estruturais de cooperação com Tel Aviv.

Essa aliança se estende também às universidades brasileiras, que funcionam como um dos braços de sustentação e legitimação do projeto sionista por meio de parcerias acadêmicas internacionais, contribuindo diretamente para o genocídio em curso, tanto na Palestina, como no Brasil, seja com acordos de desenvolvimento tecnológico, bélico, seja com parcerias que buscam “limpar a imagem” e fortalecer vínculos de reconhecimento do Estado colonial. Diversas universidades pelo país, como a USP, PUC, UFRGS, FATEC, Mackenzie, IFSP, UFSM e UFMG, mantêm relações intactas, mesmo diante da intensficação do genocídio, em formas de convênio, programas de estágio, núcleos e projetos. A Universidade de São Paulo (USP) é um exemplo de instituição que vai além de manter parcerias acadêmicas com universidades israelenses: ela estabeleceu uma cooperação direta com o Consulado de Israel, criando o espaço “Corner Israel” dentro do campus, que funciona como uma vitrine de propaganda de um Estado que pratica limpeza étnica há mais de sete décadas.

Outro caso é o da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que assinou acordos com a Universidade Hebraica de Jerusalém, instituição localizada em território ocupado e envolvida no desenvolvimento de tecnologias bélicas. Até mesmo instituições de pesquisa em ciência e tecnologia, como a Embraer e o ITA (Instituto Tecnológico da Aeronáutica), já tiveram intercâmbios com empresas e universidades israelenses, reforçando a lógica de subordinação tecnológica do Brasil a interesses estrangeiros. Cada convênio, cada intercâmbio e cada acordo assinado com uma universidade israelense significa fortalecer a infraestrutura científica que dá sustentação ao apartheid e ao genocídio contra os palestinos. Ao mesmo tempo, reforça a dependência do Brasil em relação a tecnologias externas, subordinando nossas universidades a interesses que não servem à classe trabalhadora, mas sim à lógica do capital e da repressão.

A luta pela libertação da Palestina não pode se restringir a discursos: é preciso cortar os laços com Israel, rompendo acordos nas mais diversas áreas que sustentam o projeto colonial. A resistência e a solidariedade internacional ganham força nesse momento, unindo trabalhadores e povos oprimidos contra o imperialismo e o colonialismo em todas as suas formas. O internacionalismo proletário é um princípio inegociável na construção das lutas por emancipação da classe trabalhadora e foi fundamental, ao longo do século XX, para a vitória dos povos oprimidos contra os pactos coloniais e os interesses imperialistas que estruturam a dominação das burguesias. A persistência do projeto colonial genocida hoje, representada pelo Estado de Israel, reafirma que as formas de dominação capitalista não carregam qualquer ‘avanço civilizatório’, como propagam os ideólogos burgueses. Os pactos coloniais não foram superados e só o serão através de um movimento articulado entre o proletariado mundial, comprometido com as lutas de libertação nacional e pelo socialismo-comunismo.

Hoje, o cenário de desarticulação do movimento comunista internacional impõe uma série de fragilidades à luta internacionalista, ainda fragmentada e muitas vezes incapaz de reagir coordenadamente à intensificação dos ataques à classe trabalhadora, muito mais intensos nos países dependentes ou que vivem em um contexto de ocupação colonial, como é o caso palestino. Nós do PCBR entendemos a necessidade de superar esse estado de coisas e trabalhamos pelo fortalecimento, no interior do movimento comunista internacional, de um bloco de partidos e organizações comunistas e proletários revolucionários, em luta contra o reformismo, o etapismo e o reboquismo em nosso movimento.

Esse fortalecimento, porém, não se fará isoladamente, mas na construção, no fervor das lutas em curso, das mais consequentes formas de luta junto aos segmentos mais dispostos ao enfrentamento ao bloco sionista-imperialista. Diversas iniciativas importantes têm sido construídas, como o Movimento internacional por Boicote, Desinvestimentos e Sanções (BDS), que tem mapeado as relações comerciais e militares do Estado sionista de Israel com os países pelo mundo e demonstrado a rede imperialista que sustenta o genocídio. Em setembro, por exemplo, denunciamos junto ao BDS e construímos junto aos trabalhadores de Santos/SP um movimento contra o envio de um navio, carregando 56 toneladas de aço para Israel. O Brasil também é responsável por quase 10% do suprimento de combustíveis de Israel.

No mundo inteiro, movimentos de bloqueio têm sido construídos e ampliado o sentido concreto das táticas. Nesse sentido, construímos, cotidianamente, através da atuação nos Comitês de Luta e Solidariedade ao Povo Palestino pelo país, abertos para a construção junto a todas as pessoas que estiverem comprometidas a lutar contra o genocídio em curso.

É nesse esforço coletivo que o movimento estudantil cumpre um papel fundamental na solidariedade internacional e no apoio à resistência palestina. Historicamente, o movimento estudantil tem sido um dos setores mais combativos da sociedade, protagonizando pressões e mobilizações em universidades de todo o mundo contra regimes coloniais e projetos imperialistas. No Brasil, essa pressão organizada tem avançado e arrancado o rompimento dessas relações, no último dia 29 de setembro, uma vitória histórica foi alcançada com o rompimento das relações da UFF e da Unicamp com as universidades israelenses Ben Gurion e Technion, diretamente envolvidas no desenvolvimento de tecnologias usadas no genocídio contra o povo palestino. O convênio da Unicamp com a Technion existia desde 2009 e havia sido renovado em 2024, apesar da mobilização estudantil para barrar sua continuidade. Agora, diante da escalada da crise em Gaza, a pressão do movimento estudantil, somada à paralisação do sindicato dos trabalhadores e à posição da ADUnicamp, forçou a reitoria a anunciar a suspensão das relações. Ao mesmo tempo, universidades brasileiras têm buscado formas concretas de solidariedade à causa palestina. A UFABC, por exemplo, firmou um acordo de cooperação acadêmica e científica com a Birzeit University, fortalecendo a colaboração em diversas áreas do conhecimento para enfrentar os impactos da violência nos setores de educação e pesquisa nos territórios palestinos ocupados. Essa parceria viabilizou cursos como “História, Sociologia, Cultura e Resistência da Palestina”, evidenciando como a universidade pode se tornar um espaço de resistência e preservação da cultura e da história palestina. O Grupo de Cooperação Internacional de Universidades Brasileiras também tem promovido a inclusão de refugiados palestinos em instituições de ensino do país, oferecendo vagas para graduação, mestrado e doutorado em universidades como os CEFETs de Minas Gerais e do Rio de Janeiro, a Universidade Federal Fluminense (UFF) e a Universidade Federal do Paraná (UFPR). Na Unicamp, o Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social e o Centro de Estudos de Migrações Internacionais (CEMI) promoveram o minicurso “Pensando a Palestina a partir de múltiplos processos de deslocamento/reposicionamento situacionais”, reforçando o papel das instituições de ensino na promoção da reflexão crítica, na valorização da cultura palestina e no fortalecimento da solidariedade entre os povos.  A cada universidade brasileira que rompe relações com universidades e empresas que financiam o estado de Israel; que deixa de ser cúmplice do genocídio e de colocar sua produção científica e acadêmica à serviço do extermínio, é dado ao povo palestino melhores condições de resistência ao processo de apartheid e genocídio. A luta do povo palestino é parte inseparável da luta de todos os povos contra o imperialismo e o colonialismo. Cabe a nós, estudantes e trabalhadores, assumir o compromisso ativo de romper a cumplicidade do Brasil com Israel e fortalecer a solidariedade internacional até a Palestina ser livre, do rio ao mar.