Manifesto da União da Juventude Comunista para o 71º CONEG
Disputar o Presente e Construir o Futuro: Organizar os trabalhadores e a juventude para derrotar o liberalismo e a extrema-direita.

Disputar o Presente e Construir o Futuro: Organizar os trabalhadores e a juventude para derrotar o liberalismo e a extrema-direita
CONJUNTURA
O 71º Conselho Nacional de Entidades Gerais da União Nacional dos Estudantes reúne as principais entidades estudantis de nível superior do Brasil, para, nesse semestre, convocar o 60° Congresso da UNE e aprovar o regimento eleitoral. Este Congresso da UNE será realizado nos marcos do terceiro ano do Governo Lula-Alckmin, eleito em uma coalizão de Frente Ampla, que, apesar de ter derrotado eleitoralmente a extrema-direita, não significou uma derrota real, ideológica ou da desarticulação destes setores, visto a capilaridade que a extrema-direita mantém entre as massas e sua influência na opinião pública.
Mesmo com os intentos golpistas, o campo democrático-popular é incapaz de efetivar políticas concretas de enfrentamento à extrema-direita. Na verdade, os militares e os grandes empresários financiadores das tentativas de golpe (incluindo o episódio de 8 de janeiro de 2023) seguem intocados. A extrema-direita brasileira segue acumulando forças e poder, seja por dentro das instituições da democracia burguesa (como expresso nas eleições municipais), seja conspirando contra as mesmas.
O Governo Lula-Alckmin é incapaz de derrotar a extrema-direita e responder às demandas da classe trabalhadora e da juventude. Isso acontece, em primeiro lugar, porque tanto o Governo como a esquerda social-liberal hegemônica (representada pelos setores governistas que orbitam o PT e que constroem o campo majoritário da UNE) se negam a fortalecer táticas de resposta à ameaça golpista a partir da mobilização e organização ativa da população, deixando que a defesa dos direitos e conquistas da classe trabalhadora, ameaçados pela agenda golpista, fiquem refém do culto a instituições como o STF - instituição que legitima cotidianamente a violência policial, os ataques aos direitos democráticos e sociais da classe trabalhadora, como foi feito com o Piso da Enfermagem, o desmonte da legislação trabalhista e a derrubada da liminar que impedia a ampliação das Escolas Cívico-Militares. O golpismo que emerge dos setores mais reacionários da própria burocracia estatal, em conluio com a grande burguesia, não será derrotado com ações judiciais: precisa ser intimidado e esmagado pela democracia exercida nas ruas e nos locais de trabalho e estudo pela própria maioria social oprimida e explorada.
Em segundo lugar, as prioridades políticas desse governo, logo em seus primeiros meses de mandato, deixaram claro a quais interesses as suas políticas atenderiam. Enquanto retomava algumas políticas sociais importantes, embora insuficientes, como a política de valorização real do salário mínimo e diversos programas sociais sucateados pelos governos anteriores, o governo federal manteve a maioria das medidas aprovadas nos governos de Michel Temer e Bolsonaro, como a privatização de empresas públicas e suas subsidiárias, as contrarreformas da previdência e trabalhistas, o Novo Ensino Médio, a autonomização do Banco Central, etc. Tais políticas foram essenciais nos últimos anos para reduzir o valor da força de trabalho, por meio do desemprego e da precarização do trabalho, ampliando os lucros dos grandes monopólios, fortalecendo os valores e políticas neoliberais na sociedade brasileira e ampliando a área de exploração do capital financeiro dentro da economia do país. Para governar com apoio da burguesia, Lula e Alckmin atuam dentro dos ditames organizados nos anos anteriores. Essa é a brilhante tática da Frente Ampla para evitar o fortalecimento do golpismo: cumprir à risca tudo aquilo que a classe dominante brasileira exigir. Não à toa perdem cada vez mais o apoio popular.
Como uma de suas primeiras medidas, contrariando a própria fala de Lula na posse presidencial, o Governo apresentou o Novo Arcabouço Fiscal, uma reedição do Teto de Gastos de Temer. O Novo Arcabouço Fiscal dá continuidade à lógica do Teto de Gastos e asfixia a capacidade de financiamento de serviços públicos pelo Estado, pondo em risco os Pisos Constitucionais da Saúde e da Educação, gerando ataques ao Benefício de Prestação Continuada (BPC) e a redução do Bolsa Família. Se, por um lado, observamos a retirada do financiamento dos serviços públicos, por outro, o decreto 11.964 permite o financiamento público de parcerias público-privadas (PPPs) que abre espaço para a exploração privada dos serviços públicos, como educação, saúde, segurança pública e principalmente os presídios, incentivando cada dia mais o encarceramento em massa da população negra do Brasil.
A política do campo democrático-popular não apenas não responde às demandas dos trabalhadores (reverter a realidade de precarização do trabalho e piora das condições de vida, reverter a precarização da educação e saúde pública, garantir o acesso e permanência dos filhos da classe trabalhadora a educação superior pública), mas também ataca suas condições de vida, jogando setores da nossa classe para o colo da extrema-direita.
Enquanto juventude, não podemos seguir na paralisia e dissenso que reina sobre a esquerda enquanto não há perspectiva positiva para a classe trabalhadora. Necessitamos, desde já, criar um espaço de unidade de ação pautada na independência política dos nossos interesses e que realmente seja capaz de travar uma luta nacional e criar uma alternativa que não seja a camuflagem do neoliberalismo. Enquanto comunistas, devemos construir uma agenda de lutas que mobilize os estudantes e trabalhadores, fazendo frente à precarização da vida e do trabalho, aos ataques da burguesia e dos governos à educação e aos serviços públicos, lutando pela possibilidade de acesso e permanência da classe trabalhadora ao ensino superior, organizando cada estudante para lutar em seu local de estudo pela Universidade Popular. Por conta disso, é imprescindível que nós estejamos preparados para construir uma alternativa revolucionária que atenda as demandas da nossa classe e que, por meio da organização, tenhamos força para derrotar a extrema-direita e a agenda neoliberal que massacra o nosso povo.
JUVENTUDE E PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO
A juventude trabalhadora brasileira vive hoje o aprofundamento brutal da crise do capital. A precarização do trabalho deixou de ser exceção e se tornou regra, especialmente entre jovens que são lançados desde cedo ao mercado em condições cada vez mais desumanas. A escala 6x1 é a forma que se apresenta a superexploração da nossa classe em geral e da juventude em particular: seis dias de labuta para um único de descanso, negando à juventude o direito ao lazer, à educação e à própria vida.
Esse modelo de jornada expressa a lógica capitalista que extrai o máximo de força de trabalho com o mínimo de contrapartida. Junto disso, avançamos para formas ainda mais agressivas de precarização, como a uberização do trabalho. Jovens são empurrados para a informalidade, onde não há direitos trabalhistas, segurança ou estabilidade. São entregadores, motoristas de aplicativo, freelancers exauridos por metas inalcançáveis e jornadas intermináveis, transformados em “empreendedores de si mesmos”, mas sem qualquer controle sobre sua própria vida.
Essa falsa autonomia esconde uma realidade brutal: sem vínculo empregatício, sem direito a férias, licenças ou previdência, esses jovens são descartáveis para o capital. A uberização é a expressão máxima do neoliberalismo – que destrói a CLT, desmonta a previdência pública e normaliza o adoecimento físico e mental da juventude trabalhadora.
A falta de orçamento para as políticas de permanência e o sucateamento, também por causa do desmonte causado pelo arcabouço fiscal, nas universidades são elementos centrais para manter e aprofundar tal cenário. Muitos estudantes são obrigados a dividir suas vidas entre os estudos e o trabalho para poder permanecer no ensino superior, sendo jogados para a escala 6X1 e trabalhos precários, sendo retirado o direito para esses estudantes a viverem de fato a universidade e a produção de conhecimento.
Lutamos pelo fim da escala 6x1, pela redução da jornada para 30 horas semanais para 4 dias trabalhados e três dias de descanso, e pelo reconhecimento dos direitos de todos os trabalhadores informais. Também lutamos pela ampliação do investimento público nas políticas de permanência nas universidades: queremos mais orçamento para nossa entrada e permanência no Ensino Superior!
MOVIMENTO ESTUDANTIL
A história demonstra que o Movimento Estudantil Brasileiro teve, em diversos momentos, o papel de reserva de forças na luta dos trabalhadores e papel de destaque na defesa da educação pública. Desde o combate à ditadura militar até as lutas contemporâneas contra o Novo Teto de Gastos, o Regime de Recuperação Fiscal e as tentativas de privatização dos serviços públicos dentro das universidades, os estudantes seguem mobilizados por meio de atos, assembleias, conselhos e ocupações.
Nesse cenário, as Entidades Gerais do movimento estudantil cumprem um papel fundamental na organização e mobilização da juventude, especialmente dos filhos e filhas da classe trabalhadora, que enfrentam inúmeras dificuldades para ingressar e permanecer na universidade, em uma realidade onde apenas 11,4% dos jovens que cursam o ensino superior estão nas instituições públicas. Essas entidades têm o potencial de se tornar verdadeiras trincheiras de luta e conscientização, contribuindo para o enraizamento das lutas populares dentro do espaço universitário e servindo como instrumentos de elevação da consciência política dos estudantes.
Uma Entidade Geral verdadeiramente comprometida com a construção de uma Universidade Popular deve vincular sua atuação às necessidades concretas da juventude trabalhadora, que muitas vezes é impedida de frequentar as salas de aula pela jornada de trabalho exaustiva imposta pelo capitalismo. É necessário reconhecer que não haverá universidade popular sob um sistema que marginaliza e exclui a maioria da população. Por isso, o movimento estudantil deve se somar à luta pela redução da jornada de trabalho, pela permanência estudantil e pelo enfrentamento à lógica produtivista que transforma o ensino em mercadoria.
No Brasil, contamos com a maior entidade estudantil da América Latina, a União Nacional dos Estudantes (UNE), que possui capilaridade para atingir todos os estados do país. Isso, por si só, representa uma conquista histórica — sobretudo se compararmos com a realidade de outros países latino-americanos, onde a organização estudantil é mais fragmentada.
No entanto, esse potencial vem sendo limitado, há pelo menos três décadas, por uma estratégia liberal que submete a UNE à lógica da conciliação de classes, sob a direção majoritária da UJS e JPT. Em nome do governismo, as direções majoritárias da entidade rebaixam suas bandeiras e abandonam o enfrentamento direto ao projeto burguês de educação e também as pautas históricas do Movimento Estudantil. Esse reboquismo com relação à esquerda social-liberal enfraquece a UNE e distancia a entidade das lutas concretas da juventude, tornando-a incapaz de reagir à altura dos ataques que vêm sendo promovidos — inclusive por aqueles que se dizem aliados. A postura da entidade frente a greve das federais em 2024 - quando a entidade cumpriu um papel de desmobilização -, a incapacidade da UNE hoje em articular uma luta nacionalizada pelas Cotas Trans e pelo Vestibular Indígena tendo o fim do vestibular como horizonte, se furtando de mobilizar os estudantes por suas demandas mais urgentes, como a permanência estudantil e o passe livre - pois isso significaria, consequentemente, entrar na luta contra o arcabouço fiscal - são exemplos do distanciamento da entidade das lutas concretas da classe. Enquanto atuar como linha auxiliar do governo, a entidade permanecerá incapaz de atuar com a independência necessária para levar a cabo a organização dos estudantes nacionalmente em defesa de suas pautas econômicas e políticas.
É urgente retomar a UNE como instrumento de organização e luta pela transformação radical da universidade e da sociedade. Isso significa combater frontalmente o liberalismo em todas as suas expressões — inclusive quando ele se apresenta com um verniz progressista — e fortalecer a construção de um projeto de universidade popular a serviço da classe trabalhadora e comprometida com a luta por um Brasil Socialista.
É essencial fortalecer a articulação entre os Centros e Diretórios Acadêmicos, os Diretórios Centrais de Estudantes e as Uniões Estaduais de Estudantes, de forma que essas entidades estejam organicamente conectadas às lutas concretas da juventude trabalhadora em todo esse país. Esses organismos devem atuar de maneira coordenada e estratégica, construindo uma política nacionalizada, que não apenas responda às particularidades locais, mas também aponte para uma saída coletiva e socialista frente à crise estrutural da universidade.
Para isso, os espaços amplos — como assembleias, plenárias e conselhos — precisam ser retomados. Devem deixar de ser meramente formais ou esvaziados, e se tornar verdadeiros núcleos de formação política, debates e construção programática. Não basta realizar eventos pontuais ou reproduzir velhas fórmulas de participação: é necessário elevar o nível do debate político, sistematizar as experiências locais de resistência, fomentar o enraizamento das entidades nos territórios e desenvolver uma crítica radical e consistente ao projeto de universidade burguesa.
Nesse sentido, convocamos o conjunto das entidades gerais presentes neste CONEG, bem como todas as forças políticas comprometidas com a transformação da universidade e da sociedade, à construção de um polo de oposição de esquerda no interior do movimento estudantil. Essa oposição deve ser capaz de realizar um balanço honesto e profundo das táticas adotadas tanto pela direção majoritária quanto pelas correntes da oposição, para que avancemos na construção de uma plataforma política socialista, fundamentada em princípios de independência de classe, atuação de base e ampla organização dos estudantes. Só assim poderemos reverter a atual realidade da UNE para uma entidade que seja ferramenta viva de combate ao liberalismo e de organização do povo rumo ao socialismo.
O 70º CONEG E A PREPARAÇÃO PARA O CONGRESSO DA UNE
Este Conselho de Entidades Gerais da UNE será marcado pela investida da majoritária em burocratizar ainda mais o processo Congressual, que acontece a cada dois anos, espaço onde a diretoria da entidade é eleita e a política da mesma é atualizada para as necessidades da conjuntura. Ou seja, o que está em disputa aqui não é apenas um conjunto de regras formais, mas o próprio projeto político que poderá se expressar no próximo Congresso.
Propostas que já apareceram no último CONEB em Recife, como a alteração da proporção entre estudantes e delegados por universidade e a ausência de um regimento unificado para todo o país — o que, na prática, permite à majoritária estabelecer critérios locais que dificultam ou impedem a participação da oposição — são exemplos de como a burocratização é usada para preservar artificialmente a hegemonia da UJS na direção da entidade. Trata-se de um mecanismo deliberado para impedir que uma linha política alternativa — crítica ao governismo e ao neoliberalismo — possa ser plenamente ouvida e debatida com o conjunto dos estudantes.
Isto demonstra a dificuldade crescente do governismo em manter sua política na entidade, na medida que o caráter de classe do atual governo federal fica mais explícito quando este segue com a política de austeridade fiscal - enquanto a própria entidade se torna incapaz de atender as demandas de luta dos estudantes contra a política educacional e econômica do governo.
Diante disso, nosso papel é denunciar e confrontar essa lógica antidemocrática e politicamente rebaixada, mas também apresentar uma saída: construir um polo de oposição de esquerda que, ao disputar o regimento do Congresso, afirme outro projeto de entidade — uma UNE viva, que mobilize os estudantes junto aos trabalhadores, levando ao avanço concreto nas lutas e conquistas, com o objetivo de construção de um outro projeto de universidade e de uma outra sociedade. Não buscamos apenas "representatividade", mas o reconhecimento de que é essa política — anticapitalista, classista e independente — que pode devolver vida e força à entidade.